terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Veio me visitar

Hoje um passarinho veio me visitar.

Estava muito apressado, mal pude ouvir o que falou.

Sei que foram coisas boas, por isso me senti muito feliz.

Outros passarinhos já me visitaram.

Havia um que era muito insistente. Era lindo! Tinha as penas coloridas.

Vinha todos os dias, sempre na mesma hora.

Na época, pensei que ele não gostava do vidro da janela.

Hoje acho que ele me falava em código morse, e eu achava que ele queria entrar.

Houve também um beija-flor, agitadíssimo! Parecia assustado, com medo. Não sabia como ir embora. Tentei ajudar, mas ele não entendeu. Não nos comunicamos muito bem. Fiquei com medo de lhe machucar.

Todos eles me traziam boas notícias.

Por isso, o de hoje, me trouxe tanta alegria.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Arrumar o armário

É hora de arrumar o armário.

Abro as portas, retiro tudo que tem dentro.

Peça por peça, seleciono, classifico, separo.

Isso não quero mais, aquilo ainda vou ficar, e essas?

Hum... Não sei, deixo de lado, decido mais tarde.

O mais importante é esvaziar, tirar tudo, limpar.

Olho e vejo o que quero daquilo tudo.

Fazendo a faxina.

Quanta coisa guardada desnecessariamente!

Porque guardei tudo isso?

Coisas novas, outras velhas, outras ainda muito velhas.

Quanto lixo!

Hora de recolocar, peça por peça.

Tudo limpo e arrumado.

Mas isso não é permanente...

Mas agora está bem.

Fecho o armário.



domingo, 6 de dezembro de 2009

O Impostor



Recuso-me a olhar para minha própria vida. Tento impressionar os outros com minha inteligência, minha perfeição. Tento intimidar.

Olhando para mim, não consigo ver que mostro sinais de desespero profundo. Rosto rígido!

Para não perder o humor e senso de proporção escondo minha autodepreciação.

Quantas vidas arruinei? Qual o alcance e a amplitude de minha maldade? Conseguirei encobrir o meu mais profundo senso de desvalia e insignificância? Estarei eu perdendo as qualidades humanas?

Que ego bizarro!

Não posso parar de sorrir. Tenho que me relacionar com os outros. Não vou me destruir! Não posso ser derrotado! Tenho que me mostrar impecável e irrepreensível!

Tenho medo que descubram que sou uma fraude. Sempre dei falsa impressão de mim. Será muito difícil para mim se eu for desmascarado.

Tenho dificuldade de compartilhar meus segredos, pode ser embaraçoso. Sinto que falta conversa franca... em minha vida. Tenho tristeza pelo que jamais disse.

Mas, não posso ficar despido.

Essa é minha busca de aceitação e aprovação.

Assim, digo que sou feliz.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Luto é um processo, não um evento

Luto é um processo, não um evento

MARIA HELENA PEREIRA FRANCO
ESPECIAL PARA A FOLHA

HOJE, A SAUDADE nos leva a visitar a relação que tínhamos com nossos queridos que faleceram.
Essa visita nos fala ou relembra aquilo que dá significado à vida para muitas pessoas: a existência de um vínculo forte com alguém que, quando rompido, gera o luto. Falar de luto hoje é falar das nossas possibilidades de fazer, desfazer e refazer laços.

Não podemos falar com precisão sobre uma sequência de fases do luto. A pessoa enlutada, com frequência, encontra outras que adotaram crenças rígidas sobre o que deve ser experimentado nessa jornada ao longo do luto.
Essas crenças podem afetar profundamente o processo individual natural. Podemos encontrar respostas de desorganização, medo, culpa mas também podemos não encontrá-las. As emoções podem seguir-se umas às outras com intervalos curtos ou até mesmo duas ou mais emoções podem estar presentes ao mesmo tempo.

Cada pessoa fica enlutada de sua maneira. O luto é uma experiência pessoal e única.
Como resultado dos valores contemporâneos, as pessoas enlutadas são encorajadas a rapidamente deixar para trás o luto. Como resultado, temos duas situações: ou o enlutado vive seu processo isoladamente ou se força a abandoná-lo, antes mesmo de tê-lo completado. Amigos e familiares, bem-intencionados, mas desinformados, tentam fazer com que a pessoa enlutada desenvolva autocontrole, entendendo que essa é a resposta adequada.

As pessoas se perguntam quanto tempo dura o luto, como uma confirmação de que estão no caminho certo. Essa pergunta é diretamente relacionada à impaciência que nossa cultura tem com o pesar e o desejo de sair logo da experiência do luto. Um exemplo disso é a pressão que o enlutado sofre, logo após a perda, para voltar à atividade normal.

O luto passa a ser visto como algo a ser evitado, e não como algo que precisa ser vivido e que trará possibilidades de reconstrução. Mascarar ou fugir do luto causa ansiedade, confusão e depressão.
Viver o luto não significa passar por ele, significa crescer por meio dele, para renovar o senso de confiança e a energia, para reconhecer a realidade da morte e a capacidade de se tornar envolvido novamente. O luto é um processo, não um evento.

Além de entender na mente, vai entender no coração: a pessoa amada morreu. A dor sentida vai deixar de ser onipresente e aguda para se transformar em um sentimento de perda que pode ser admitido e que dá vez a um significado e um propósito renovados.

Embora a pessoa que morreu jamais venha a ser esquecida, a vida pode e deve continuar a ser vivida. A perda é para sempre, o luto não.

MARIA HELENA PEREIRA FRANCO é psicóloga, professora titular da PUC-SP e coordenadora do LELu (Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto), da mesma universidade.

sábado, 28 de novembro de 2009

Alguns nós de R. Laing

Alguns nós

Eu não me sinto bem
portanto eu sou mau
portanto ninguém me ama.


Eu me sinto bem
portanto eu sou bom
portanto todos me amam.


Eu sou bom
Você não me ama
portanto você é mau.
Logo, eu não te amo.


Eu sou bom
Você me ama
Portanto, você é bom.
Logo, eu te amo.


Eu sou mau
Você me ama
Portanto, você é mau.
_______


Minha mãe me ama
Eu me sinto bem
Eu me sinto bem, porque ela me ama.


Eu sou bom, porque eu me sinto bem
Eu me sinto bem, porque eu sou bom
Minha mãe me ama, porque eu sou bom.


Minha mãe não me ama
Eu me sinto mal
Eu me sinto mal, porque ela não me ama.


Eu sou mau, porque eu me sinto mal.
Eu me sinto mal, porque eu sou mau.
Eu sou mau, porque ela não me ama.
Ela não me ama, porque eu sou mau.


Referências LAING, Ronald. Knots, S.L:London, 1972.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

MODOS DE MACHO - Mulheres que dizem fim

Mulheres que dizem fim

Sex, 27 Nov

Xico Sá*


Como se dizia mui antigamente, deu na imprensa, reproduzo: as mulheres estão pedindo mais a separação do que os homens. Coisa séria. Reflita: dados sobre registro civil divulgados na última quarta-feira (25/11) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que, em 2008, 71,7% das separações não consensuais - ou seja, um quer, mas o outro não - foi pedido por mulheres.

Aproveito e reabilito uma velha tese. Velha, porém minha. Sim, homem é frouxo, só usa vírgula, no máximo um ponto e vírgula; jamais um ponto final.

Sim, o amor acaba, como sentenciou a mais bela das crônicas de Paulo Mendes Campos: "Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar..." Acaba, mas só as mulheres têm a coragem de pingar o ponto da caneta-tinteiro da convivência. E pronto. Às vezes com três exclamações, como nas manchetes sangrentas de antigamente.

Sem reticências...

Mesmo, em algumas ocasiões, contra a vontade. Sábias, sabem que não faz sentido prorrogação, os pênaltis, deixar o destino decidir na morte súbita. O homem até cria motivos a mais para que a mulher diga basta, chega, é o fim!!!

O macho pode até fugir para comprar cigarro na esquina e nunca mais voltar. E sair por ai dando baforadas aflitas no king-size do abandono, no Continental sem filtro da covardia e do desamor. Mulher se acaba, mas diz na lata, sem metáforas.

Melhor mesmo para os dois lados, é que haja o maior barraco. Um quebra-quebra miserável, celular contra a parede, controle remoto no teto, óculos na maré, acusações mútuas, o diabo-a-quatro. O amor, se é amor, não se acaba de forma civilizada. Nem no Crato...nem em Estocolmo.

Se ama de verdade, nem o mais frio dos esquimós consegue escrever o "the end" sem uma quebradeira monstruosa. Fim de amor sem baixarias é o atestado, com reconhecimento de firma e carimbo do cartório, de que o amor ali não mais estava. O mais frio, o mais "cool" dos ingleses estrebucha e fura o disco dos Smiths, I Am Human, sim, demasiadamente humano esse barraco sem fim.

O que não pode é sair por aí assobiando, camisa aberta, relax, chutando as tampinhas da indiferença para dentro dos bueiros das calçadas e do tempo. O fim do amor exige uma viuvez, um luto, não pode simplesmente pular o muro do reino da Carençolândia para exilar-se, com mala e cuia, com a primeira criatura ou com o primeiro traste que aparece pela frente.

& MODINHAS DE FÊMEA

Chama a atenção na mesma pesquisa, citada na cumeeira desta crônica, como as gaúchas, em parelha com as catarinenses, são as mulheres que mais buscam na Justiça a separação. Só na Paraíba, mulher-macho-sim-senhor, os homens são maioria no mesmo tipo de atitude legal, porém dolorosa, barraquista e cruel.

Faz favor, seu garçom, tem aquela clássica de Jane e Herondy? Sim, "não se vá", toca pra gente, play it again, Sam! Aumenta o volume que estou caindo fora. Beijos e até a próxima.

* Xico Sá, 46, é autor de "Modos de macho & modinhas de fêmea" entre outros livros. Nasceu no Crato, Cariri, cresceu no Recife e hoje ronda a noite paulistana em busca de fábulas e crônicas. Fale com ele pelo e-mail


domingo, 22 de novembro de 2009

Freud - Do blog de Vanessa - http://meudivaenacozinha.blogspot.com/

Entrevista com Freud


– Sempre me pareceu que a psicanálise desperta em todos aqueles que a praticam o espírito da caridade cristã. Não há nada na vida humana que a psicanálise não nos permita entender. E tudo compreendido é tudo perdoado.
Freud, segundo o repórter, enfureceu-se:
– Pelo contrário. Entender não é perdoar. A psicanálise não apenas nos ensina o que temos de suportar, também ensina o que temos de evitar. Nos diz o que deve ser eliminado. A tolerância do mal não é, de maneira nenhuma, uma consequência do conhecimento.

(Entrevista feita pelo jornalista americano George Viereck, em 1930)

sábado, 21 de novembro de 2009

Bem resolvido ou mal resolvido?


O comportamento ‘divertido’ pode parecer uma forma fácil de aproximação com as pessoas. Às vezes ele esconde, por meio de uma alegria forçada, a revelação de quem realmente somos.

A aproximação com as pessoas é falseada por bom humor ou num auto-astral que transforma quem se esconde nessa postura engraçada num sujeito popular.

Ser engraçado é uma forma de manter os outros interessados em si, já que essa é a forma de realizar o desejo de proximidade com os outros.

Adquire-se assim uma reputação de bom papo, bem humorado, alegre, animado, alto-astral, pessoa com auto-estima elevada, festivo, muito mais que tudo isso existe uma ‘necessidade’ se ser divertido.

Não vejo nada errado em ser divertido e em se divertir, isso é muito bom! Passa uma leveza no semblante de quem tem um coração alegre. Mas quando se deseja fazer um contato e daí compartilhar um relacionamento afetivo, esse comportamento deverá ser transformado.

Haverá um momento em que não caberá mais se esconder em um personagem vivido e reconhecido por todos e o tempo todo como a pessoa que está de bem com a vida, aquele que parece não ter problemas, e se tem, ele sabe conduzi-los ou administrá-los de forma magnânima. Chega a causar inveja e curiosidade o seu comportamento. Parece que isso incomoda as pessoas, e assim não é desejável que se seja tão feliz.

Esse personagem que se esconde e minimiza os sentimentos de maneira evasiva não terá mais lugar em algum momento quando não quiser ficar mais sozinho.

Há de falar da dor que está sentindo. Falar da vida com seriedade. Nesse momento assume-se o risco de se revelar.

O que poderá acontecer quando for inevitável ter que se mostrar? O que, ou quem poderemos ver?

Não é fácil deixar um repertório social, criado exatamente para ser o que todo mundo conhece! Se não for assim, como teremos intimidade? Provavelmente isso gere angústia, medo, ansiedade. Toda essa mudança causa certa tensão.

Mas, se pensarmos que tudo é impermanente, que tudo muda o tempo todo, que não existem garantias de nada, poderíamos ser mais abertos, permitir nos mostrar e não ter medo de amar. Qual será o momento que poderemos mostrar e liberar nossos sentimentos verdadeiros se não agora?


domingo, 15 de novembro de 2009

A Vida é um Sonho

A vida é um sonho, e geralmente preferimos não acordar.

Estava me afogando e achava que ia afundar sozinha, procurava loucamente ajuda, mas ao contrário do que eu poderia esperar, meu companheiro não via o que me acontecia, embora estivesse olhando pra mim.

Talvez se eu gritasse, ele pudesse ouvir meu pedido de socorro... Queria que ele me notasse, lesse em meus olhos, ouvisse meu coração que batia alto e acelerado. Mas era como se eu não existisse. Meus braços agitados, meu grito engasgado, meu semblante de pânico, nada o mobilizava. Penso que mesmo que eu gritasse, falasse, tocasse, nada... Nada mesmo, que eu pudesse fazer seria entendido como pedido de ajuda, nada o faria perceber toda minha angustia, nada o faria me ver. E assim, fui afundando, sozinha, até chegar ao fundo do mar. Morei no fundo do oceano por muito tempo, tive que me acostumar com o gosto do sal. Aprendi tirar proveito disso.

Muito, muito, muito tempo depois entendi que não estávamos no mesmo lugar, nem no mesmo tempo, não havia vínculo. E a pessoa que eu via não era a pessoa que eu conhecia e eu não era a pessoa que ele via. Nunca nos encontramos. Foi uma vivência não compartilhada. Nada aconteceu.


domingo, 1 de novembro de 2009

Dentro de mim

Tem um momento em que ficamos sós.

Só terei eu comigo.

Meus pensamentos transitam como um jogo e tento pará-los.

Esvazio-me de tudo, não quero pensar.

Aquieto-me, não brigo mais.

Escuto sons. Pequenos sons, perto, loooonge, bem distante.

Procuro não pensar que estou pensando.

Não quero conduzir o que estou sentindo. Entrego-me.

Enfim consigo. Sem pensamentos. Sem conceitos.

Assim, tudo sou eu.

Não estou aqui.

Sinto uma rápida e profunda alegria.

Tudo pára, porque o sino toca.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Livro: A criança mal amada


Conversava com uma amiga sobre o fato de haver muitos artigos sobre o pai ausente. Nesta oportunidade foi que conheci o conto de Guimarães Rosa – A terceira margem do rio. Fiquei encantada com a beleza e a densidade do texto. Em nossa conversa, ficou evidente que existia quase nada falando de mãe ausente. Daí veio-me a curiosidade de procurar sobre o assunto. Encontro um livro que me subsidia com suas fundamentações teóricas em muito daquilo que eu procurava.


*O livro é:

A criança mal amada – estudo sobre a potencialidade melancólica – Maria Lucia Vieira Violante.

Sinopse: A obra coloca a psicanálise a serviço do campo social. O livro analisa crianças que, através de suas mães ou substitutos, recorrem ao serviço psicológico. A autora chega a uma conclusão importante e audaciosa ao propor o conceito de potencialidade melancólica.


O livro é fruto de estudo de caso usado pela autora quando de sua defesa de doutorado. Todo trabalho estrutura-se no fato de numa situação de abandono materno, combinado ou não com o abandono paterno, em que a criança não desenvolve uma melancolia completa e sim o que a autora denomina de “potencialidade melancólica”.


Lucia Violante promove um debate entre Piera Aulognier e Freud em que o tema é o narcisismo que dará sustentação à sua fala integrando atendimentos clínicos, a realidade social e familiar das crianças envolvidas, proporcionando assim o conceito de potencialidade melancólica.


Segundo Lucia embora a violência e a miséria estejam presentes na vida dessas crianças não são esses os motivos diretos que justificam a ‘potencialidade melancólica’ pois ocorre a rejeição velada em famílias com condições sócio-econômicas satisfatórias.


A potencialidade melancólica ocorre por vários fatores: constitucional, disposicional e advindo de experiências de vida na infância.


Maria Lucia foca sua análise em casos onde há perda prematura do amor materno (por rejeição ou morte) que provoca uma desqualificação do narcisismo infantil.


Vale esclarecer que o narcisismo é o amor a si, já o amor materno leva a criança a investir no próprio Eu para depois investir no Eu do outro.


O desejo da mãe pelo filho faz surgir o narcisismo do filho que o introduz na ordem da sexualidade, que mais tarde deverá ser transformado pela função paterna.


“A mãe introduz o bebê na ordem da sexualidade, através da erogenização do seu corpo biológico, que o transforma num corpo erógeno.”


A rejeição materna desqualifica o filho, impedindo o auto investimento no Eu. Se a mãe recusa dar prazer, a criança acredita ser desprovida de atributos desejáveis. O primeiro objeto de amor, a mãe, que é o primeiro representante do outro será o protótipo de todas as relações posteriores. A mãe instaura o desejo, ao pai cabe estruturá-lo. O desejo da mãe representa o suporte identificatório, assim como o desejo do pai de ter filhos e por aquele filho desempenha papel importante na construção psíquica da criança. Será a mãe sua primeira proteção contra ansiedade (que deverá ser substituída pelo pai).


A função paterna relativiza o narcisismo e o introduz na ordem do simbólico pela castração. Para a construção psíquica haverá a construção e a eleições das idéias (função do pai).


Quando acontece, da criança, além de não ter a quem ou por quem renunciar (não ter a mãe), a ausência do pai aprofundará seu vazio e estando impedida de referências, de modelo de identificação, não se estabelecerá a função de proteção e de interdição. A função paterna permitirá a criança, a aquisição de uma identidade sexual e um destino sexuado.


Entendo assim, que é necessário que se tenha primeiro uma mãe e na seqüência um pai. Faz-se necessário dizer que a função do pai transcende a sua própria presença. Ao mesmo tempo é considerada necessária a presença do pai da criança, ao lado da mãe, a quem ela dedica sentimentos positivos.


Apesar de a autora dedicar seu estudo a criança isso ajudará na compreensão do adulto e seu comportamento.


Lucia cita Aulagnier para dizer que ser mãe implica em: amar a criança, ter realizado a repressão da própria sexualidade infantil, estar de acordo com o fundamento do discurso cultural acerca da função materna e devotar sentimentos positivos em relação ao pai da criança, ao seu lado – um Outro que seja ponto de apoio para seu Eu e suporte de investimento.


Em outro momento Maria Lucia ao contrapor as idéias de Freud com as de Piera Aulagnier constata que a criança se pergunta de onde ela própria vem antes de formular a pergunta explicitamente “de onde vem as crianças?” As questões de sua origem lhe colocam possíveis respostas: venho do desejo, do ódio, do acaso, da indiferença ou do acidente biológico. Ainda dentro da mediação dessas idéias, Lucia fala que o prazer é entendido, pela criança, como desejo do outro de reunificação e de dar prazer, e que todo desprazer é entendido como desejo do outro de rejeição, de recusa de prazer. Conclui-se que essa relação vista como ato de amor, é unificadora; no caso contrário, será odiante, hostil e destrutivo.


A autora ainda faz considerações acerca da melancolia e da mania por esses aspectos estar presente nos sujeitos do estudo. Os sujeitos são três meninos que possuem em suas histórias de vida o abandono materno (com e sem abandono paterno), ela usa como contraponto um quarto caso de uma menina, que apesar da violência da relação incestuosa sofrida pela criança o auto-ódio não se apresenta, mas sim conflitos de desejos. Essa criança apesar de tudo apresenta auto-estima e ao final do seu acompanhamento, todas as funções (corporais, psíquicas, objetos de sua relação com os outros) encontravam-se investidas.



“Na potencialidade melancólica o sujeito apresenta baixa auto-estima; suas defesas não são acionadas para proteção de sua auto-estima, mas sim para tentar instaurá-la, e via de regra, sem sucesso; e, mais, trata-se de pessoas absolutamente dependentes do outro.”



sábado, 10 de outubro de 2009

VOAR

Quando Marina era pequena, não lembro bem que idade ela tinha, nós descíamos para ficar brincado. Ás vezes no parquinho, mas principalmente para desfrutar do espaço livre. O vento era uma coisa gostosa e ninguém ficava de cabelo arrumado, parecia que a empurrava de tão forte que era e por ela ser pequena e magrinha eu achava que ela podia cair.


Marina abria os braços e corria, corria, corria, corria sem parar. Depois de tanto correr e um tanto quanto cansada, ela vinha me abraçar com uma carinha de triste e me confessava baixinho o que estava fazendo: Estou tentando voar! Vou de novo! Após muitas tentativas, dava para sentir que ela estava preste a chorar, tamanho era seu desapontamento. Eu sempre dizia: Continue tentando! Você consegue! Vá lá! Mas ha cada tentativa um desapontamento. Mesmo assim, eu dizia: Acredite! Se você acreditar que pode, você voa! Percebi que ela foi desanimando, desanimando com tantas tentativas. Cheguei pra ela e disse: Quando for dormir, você vai sonhar voando porque você está tentando fazer isso aqui, e lá, você vai controlar. Não sei se ela entendeu.


Depois vendo um desenho das meninas super poderosas ela me chama e diz qual das três meninas era ela e que queria voar como aquela do desenho. Tentei reforçar a idéia do sonho novamente, não sei se ajudou.


Com o passar do tempo ela foi ficando descrente da idéia, passou a achar que não pudesse fazer o que tanto desejava. Parece que já não acredita mais.


Fico pensando o que eu poderia ter oferecido para que ela se sentisse encorajada a buscar, a investir, no que tanto queria. Como eu poderia ter ajudado? Como?


Hoje ela não fala mais que quer voar. Minha intuição me diz que ela é uma águia, mas pensa que é uma galinha.


“O poeta sonhou que era borboleta. E como borboleta ele sonhava que era ser humano e surgia a dúvida...”

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

“COMO” OU “PORQUE”?


Quando tentamos explicar ou pedir explicações usamos o ‘porque’. Esse ‘porque’ deverá enumerar uma série de razões, poderemos dizer que teremos citações explicativas. No entanto já ouvi várias vezes a seguinte frase: “isso explica, mas não justifica”. Sou levada a pensar que quando vemos algo que foge à nossa lógica, mesmo quando ouvimos todas as explicações, não é possível justificar o que foi explicado, permanece uma inquietação desconfortável.


Entendo que o ‘porque’ por mais esclarecedor que possa ser, ele reflete apenas as questões de ordem externa, como uma exposição visual dos fatos, podendo se estender à explicações de suas conseqüências.


Outra constatação é que o relato em conseqüência desse ‘porque’ não causa necessariamente uma aceitação, empatia, compaixão.


Sendo assim se pensarmos em um fato, qualquer um que seja, e perguntarmos o ‘por quê’ teremos uma visão parcial do ocorrido. Nesse aspecto o ‘porque’ toma partido e fica de um lado da história.


Geralmente os ‘por quês’ não são neutros eles tomam posições, lados, partidos e nesse sentido é preciso escolher, entre acusar ou defender, o fato, o ato, o comportamento da pessoa ou o que quer que seja.


O ‘porque’ pode ajudar, mas não pacifica, mesmo fazendo seguidos ‘por quês’, não será a quantidade de explicações que trará a resposta.


Talvez nada responda mesmo. Mas quando perguntamos: Como aconteceu isso? Como alguém pode fazer isso? Como? Teremos outro tipo de questionamento. Nesse momento estaremos ouvindo o não dito. Na nossa pergunta com o ‘como’ estaremos procurando saber dos processos internos que ocasionaram o acontecimento, o comportamento, o fato.


De outra forma, vejo que será o ‘como’ que poderá pacificar, que melhor nos confortará. Quando procuramos saber do ‘como’ estaremos penetrando em algo relativo ao interno. Poderemos acessar na perspectiva do outro, objeto da observação. O ‘como’ nos remete á idéia dos processos que desenvolvemos internamente e acessa algo mais profundo.


O ‘como’ está perto da idéia das causas. Ao ouvirmos o ‘como’ numa explicação se não concordarmos também não condenamos, nele não há a idéia de julgamento. Com ele apenas paramos, vemos, e constatamos os fatos como eles são. Então diremos: aceitando ou não, é isso!


O ‘como’ tem a qualidade de buscar as causas dos fatos/comportamentos em vez de explicar seus efeitos.


Tentar explicar é um caminho, mas quando vemos as causas nos aquietamos, pois constatarmos que não nos resta muito o que dizer.




sábado, 26 de setembro de 2009

Existe um lugar assim...

Existe um lugar e as pessoas deste lugar

- Vivem mil anos ou mais;

- Tudo de que necessitam é obtida sem esforço;

- Vivem com muito luxo;

- Desfrutam de todos os prazeres, todos os desejos são realizados, desde os mais simples tudo é imediatamente realizado.

- Até mesmo seus sonhos são os mais prazerosos.

- Tem uma preocupação excessiva com a auto-imagem e a estética, só gostam de ficar perto daqueles que contribuem para sua auto-fascinação.

- Acabam por desenvolver egocentrismo e são obcecados por sentir prazer.


Sendo assim querem apenas o bem estar a eles próprios, às suas posses, às pessoas que lhes atendem.


Nos seus últimos dias de vida são avisados de que morrerão. As suas riquezas e posses começam a diminuir e experimentam um sofrimento insuportável. Nesta última semana de suas vidas é que sentem uma intensa angústia. Uma dor inimaginável!


Já pensou após viver mil anos de pura alegria e prazer sair desse estado bruscamente?


Quando um amigo chega naquela semana que se aproxima da morte, os outros se afastam rapidamente, pois não suportam ver. Não fazem nada por ninguém.


À medida que o tempo passa vão se tornando mais frios. Acabam por se tornar egoístas, insensíveis, irresponsáveis e cheios de tédio. Trancam-se em se mesmos até o ponto da extrema solidão.


Temos que concordar que quem vive mil anos num verdadeiro paraíso não irá passar a vida toda, pensando nos momentos finais da sua maravilhosa vida. Não acha?


Por serem assim, as pessoas deste lugar são orgulhosas e vaidosas e se acham capazes de tudo.


O grande mal que pode ocorrer é quando um ser humano se ‘contamina’ com o padrão mental das pessoas desse lugar os humanos passam a acreditar que tem poder, não conseguem se identificar com quem sofre. Por conta de seu orgulho não conseguem da conta do maior medo que sentem: o desamparo e a insignificância.


Mas alguns dirão que é natural querer o prazer pessoal, admiração, gostar de ser bem servido. Não é mesmo?




*Essa história é fruto de minha leitura do livro: Mania de Sofrer, de Bel Cesar, referente ao IV capítulo - Reino dos Deuses: solidão e orgulho – Experiências de auto-absorção.



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